Maior felino do continente americano, a onça-pintada teve uma redução populacional de 30% nos últimos 27 anos no Brasil. Na Amazônia, neste mesmo período, foi observado um declínio de ao menos 10% da espécie na região.
Os números são resultados do estudo "Avaliação do risco de extinção da onça-pintada (Panthera onca), divulgado na semana passada pelo ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação e Biodiversidade) e integra a publicação Biodiversidade Brasileira (BioBrasil).
Segundo o estudo do ICMBio, a onça-pintada ocupa 89% da extensão da Amazônia, mas apesar dessa ampla distribuição a população da espécie é de menos de 10 mil indivíduos.
O estudo fez também uma radiografia da população de onça-parda (Puma concolo). Em 21 anos, a população dessa espécie caiu dez pontos percentuais. No bioma amazônico, onça-pintada e onça-parda (também com população estimada em menos de 10 mil) estão categorizadas como vulneráveis na lista de risco de extinção.
No Pantanal, a estimativa populacional de onça-pintada é de mil indivíduos. Em outros três biomas (Mata Atlântica, Cerrado e Caatinga) acredita-se que haja no máximo 250 indivíduos adultos da espécie, em cada um. Não há registro de onças-pintadas nos Pampas.
O estudo do ICMBio apresenta o resultado da avaliação de extinção da espécie de onça-pintada nos biomas brasileiros, realizada em 2011 por especialistas em felinos. A revista apresenta os resultados da avaliação do risco de extinção de todas as espécies de mamíferos carnívoros do Brasil.
As principais ameaças à espécie, diz o estudo, são perda e fragmentação de habitat associadas principalmente à expansão agropecuária, mineração, usinas hidrelétricas, ampliação da malha viária (estradas) e a eliminação por caça ou retaliação devido ao ataque da onça a criação de animais domésticos.
Com a expansão urbana nas cidades e redução de suas presas naturais devido à caça destes por seres humanos, a onça-pintada é forçada a recorrer a animais domésticos, sobretudo de rebanhos, causando revolta nos moradores das comunidades rurais.
Segundo o estudo, a diminuição iminente dos remanescentes florestais, resultante das mudanças efetuadas no Código Florestal Brasileiro, também representa uma séria ameaça à subpopulação de onça-pintada no Brasil.
População da Amazônia
Embora esteja numa situação menos crítica, a onça-pintada (assim como a onça parda) que vive no bioma amazônico está longe de repousar em uma condição confortável. Pelo contrário, com redução de floresta, a espécie tende a ficar mais pressionada.
Diogo Faria, veterinário e analista ambiental do Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) no Amazonas, diz que se as taxas de desmatamento forem mantidas, provocando a redução do ambiente natural dos felinos e demais animais, é provável que as onças-pintadas que vivem na região amazônica entrem no mesmo nível de situação crítica dos felinos do Cerrado, da Mata Atlântica e do Pantanal.
"Quais são os problemas da onça pintada? O desmatamento, o avanço da fronteira agrícola, a abertura de estrada, a caça. A onça é um animal exigente e que precisam de extensos territórios. Não em pequenos fragmentos", destaca Faria, que atua pelo Núcleo de Fauna do Ibama e se dedica a resgatar animais silvestres, como onças-pintadas e onças-pardas, de situações de vulnerabilidade. É o caso de animais criados como se fossem "domésticos" e felinos silvestres órfãos.
O pesquisador Emiliano Esterci Ramalho, do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, vinculado ao Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação, diz que a Amazônia é "crucial para a conservação da espécie no Brasil".
"A maior população de onças do Brasil e do mundo está na Amazônia. No entanto não podemos achar que não deveremos fazer nada para conservá-la neste bioma. Se o Brasil continuar desmatando a Amazônia e não for cuidadoso no desenvolvimento da região iremos ver um declínio da população destes grandes felinos nas próximas décadas", diz Ramalho, que é doutor em Ecologia e Conservação de Animais Silvestres e atua como pesquisador na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, no município de Tefé (a 522 quilômetros de Manaus). Ramalho fez parte da equipe que elaborou a avaliação do risco de extinção da onça-pintada.
"Os principais motivos para a redução de todos os grandes felinos são destruição de ambientais naturais, redução das populações das presas e caça direta por seres humanos. Na Amazônia os principais motivos relatados por ribeirinhos para a caça da onça são a ameaça a animais domésticos e o risco de ataques a seres humanos", diz Ramalho.", diz Ramalho.
Conforme Emiliano Ramalho, as áreas mais críticas da Amazônia para a conservação da espécie são planícies de inundação e a região do Arco do Desmatamento, onde há forte pressão da fronteira agrícola. Nestas, o número de onças mortas anualmente ainda é muito elevado.
Abate por retaliação
As ameaças contra a sobrevivência da onça-pintada são agravadas pelas exigências de seu porte físico. Outros felinos silvestres (como jaguatirica, gato mourisco, gato maracajá, entre outros) também estão em situação vulnerável, mas seus hábitos alimentares não chegam ao mesmo nível dos da onça-pintada.
Com a redução da vegetação e com a diminuição de presas naturais devido à "disputa" com o ser humano, elas se aproximam cada vez mais das áreas onde há populações humanas (fazendas, comunidades ribeirinhas) e até mesmo das zonas urbanizadas. Com essa proximidade, ela acaba sendo alvo de retaliações de donos de criações de animais, que procuram abatê-las por "vingança".
"Uma jaguatirica sobrevive com pequenas presas. Uma onça precisa pegar bichos grandes, como antas e veados. Mas quando não tem comida, ela é obrigada a abandonar sua área e procurar outra. Muitas vezes ela está em uma área de fronteira, ou seja, entre uma floresta e uma propriedade rural. Se ela está com fome e aparece um rebanho vulnerável, desprotegido, ela acaba se aproveitando disso e aí começam os conflitos. Em vez do dono do rebanho tomar medidas de precaução, ele acha que é mais conveniente abater o bicho (onça)", explica Diogo Faria, que como analista ambiental, procura orientar os donos de criações de animais domésticos, a se prevenir contra ataques de onça para assim diminuir o abate dos felinos.
Emiliano Ramalho afirma que, apesar de ser um ato ilegal, não recrimina pessoas das comunidades por matarem onça para sua segurança porque não existe hoje nenhum apoio a estas localidades para evitar o conflito com estes grandes predadores. Ele diz que é preciso encontrar uma forma de evitar esses confrontos.
"O papel de quem trabalha na conservação da onça-pintada é buscar soluções junto aos moradores locais que vivem diariamente com estes animais.Sem a participação destas pessoas não será possível reduzir a caça de onças-pintadas na Amazônia. A assistência a estas pessoas para que possam manejar seus animais domésticos de forma adequada provavelmente ajudaria no processo, reduzindo o número de animais domésticos atacados por onças e o número de onças mortas", observa.
Resgate de onças aumentou
A perda de condições favoráveis à sua sobrevivência também tem levado a onça a se aproximar cada vez mais de comunidades onde há populações humanas. E isto, segundo Diogo, tem sido um problema, pois também aumentou o índice de onças rondando quintais. Isto tem ocorrido até mesmo em Manaus, embora ainda em menor grau. Na área da Reserva Floresta Adolpho Ducke, na Zona Norte da capital amazonense, há informações de presença de onças e registros de avistamentos delas fora da área protegida.
"De três anos para cá a gente tem recebido informações de pelo menos quatro ou cinco comunidades dizendo que têm 'problemas´ com onça. A gente não sabe se o aumento dos casos é porque as pessoas estão tendo mais informações e facilidade procurar um órgão ambiental ou se realmente aumentou a presença de onças próximo as comunidades rurais".
Em 2012, o Ibama resgatou apenas um felino silvestre no Amazonas, mas entre janeiro a outubro de 2013, foram resgatados nove felinos no Estado: cinco onças, sendo duas pintadas e três pardas, duas jaguatiricas, um gato maracajá e um gato mourisco. Eles estavam nas mais diferenças situações, inclusive sendo "criados" como animais domésticos ou vendidos (filhotes) em beira de estrada. "Por incrível que pareça, as pessoas criam onça no Amazonas como se fossem animais domésticos. Nem imaginem o risco que estão correndo", diz Diogo.
Monitoramento
A distribuição geográfica da onça-pintada abrange toda a Amazônia, com concentração em determinadas áreas, especialmente nas unidades de conservação, onde as florestas estão mais preservadas e há alimento suficiente.
O Instituto Mamirauá tem um longo histórico de pesquisa da onça-pintada. Segundo Emiliano, a população de onças da reserva é muito saudável e está estável.
Algumas onças-pintadas da reserva são monitoradas regularmente por meio de colares de telemetria GPS, que informam via satélite, a cada dois dias, a posição do animal. O monitoramento é para avaliar o comportamento das onças quando o nível da água sobe e alaga esse tipo de floresta. Exames clínicos realizados nas cinco onças este ano atestaram que elas estavam com boa saúde.
http://amazoniareal.com.br/desmatamento-reduz-em-10-a-populacao-de-oncas-pintadas-na-amazonia/
Biodiversidade:Fauna
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